domingo, 6 de fevereiro de 2011

Bichos Escrotos

Aquele reality show já estava perdendo a graça. Na verdade, já tinha perdido a graça há tempos. O país não agüentava mais aquele formato desgastado de programa, no qual estranhos ficavam confinados em uma mansão, chorando as pitangas para que a população tivesse compaixão e escolhesse o, aparentemente, mais sofrido pra ganhar a bolada de um milhão de reais. Os patrocinadores estavam a ponto de romper contrato. Aquilo que era para ser atração de horário nobre estava perdendo audiência para canais religiosos e de venda de produtos miraculosos, como a cinta que faz você emagrecer 30 quilos em um mês. E corria um boato na emissora que a cabeça de Otelo, o diretor do programa, estaria a prêmio.

- Não podemos continuar com esse programa do jeito que está, Otelo! A audiência está despencando, os patrocinadores querem nos comer vivos e ainda falta mais da metade do programa. Ou você arruma uma solução para isto, ou eu demito você e dou um fim nesta porcaria que você chama de reality show.
- Também não é assim, há 10 edições que o programa é exibido e sempre fez muito sucesso.
- Durante 60 anos eu também fiz muito sucesso, mas chegou uma hora que broxei. O ibope do programa está igual o meu pau. Não há Cristo que o faça subir.
- Senhor, até o final do programa a audiência vai subir mais que rojão em festa de São João.
- Pois trate de arrumar um Viagra logo pra essa audiência, caso contrário a única coisa dura aqui será o meu pé na sua bunda.

Otelo saiu da sala do chefe cabisbaixo, pensando em como conseguiria mudar o formato do programa e reconquistar a audiência. Pensou em colocar os participantes num ônibus e fazer um programa itinerante pelo país, mas isso já havia sido feito por outra emissora. Pensou em colocar alguns famosos juntos na casa, mas isso também já havia sido feito. Pensou até em colocar alguns animais, mas nada era novidade. A televisão estava saturada. E Otelo também estava ficando saturado de tudo aquilo.

Chegou em sua casa e se trancou no quarto, procurando uma alternativa nunca antes utilizada na TV brasileira. Sua atual esposa Mariana, 20 anos mais jovem e participante da primeira edição do programa, pouco poderia lhe ajudar. Mariana era desprovida de plenas faculdades mentais. Era incapaz de mascar chiclete e passear com seu cachorro pela orla da praia, ao mesmo tempo. Otelo sofria com isso, mas gostava de exibir Mariana nas festas importantes.

- Otelo, você nem falou comigo. Te esperei pra jantar e você se tranca no quarto?
- Mariana, estou trabalhando. Pode jantar que depois eu como alguma coisa.
- Por quê? Você comeu na rua, é? Otelo, você está me escondendo alguma coisa? Quem é a galinha?
- Mariana, a única galinha que eu como é a que a Dora cozinha aqui em casa. Ele pensou em dizer - E você, mas achou que aquilo acarretaria uma discussão de relacionamento não apropriada para aquele momento.
- Tá bom então. Vou sair com a Ju, a Cá e a Bia. Qualquer coisa me liga.
- Ok. Outras galinhas. Onde fui me enfiar, pensou Otelo.

Por outro lado, ele gostava de comer aquela galinha. Como ele mesmo dizia, quem gosta da mulher por causa do cérebro é zumbi. Mas ele precisava esquecer por um momento a galinha da Mariana e retomar o pensamento no reality show. Foi então que Otelo teve uma idéia:
- Já utilizaram animais em reality shows. Também já utilizaram mulheres vulgares e apelos eróticos. Agora, nunca utilizaram a combinação de um com o outro.
Otelo ligou seu notebook e redigiu um email para seu chefe, com a alegria de uma criança que acabara de descobrir que seus dedos enrugam no banho.

- Otelo, você deve estar louco!
- Não senhor Armando. Os telespectadores que estão loucos. Estão loucos por novidades. Tudo já foi mostrado na televisão em horário nobre: beijo gay, pinto, bunda, boceta, chupeta, entre outras coisas. Porém, nunca antes na história da televisão mundial foi mostrado relações de amor com animais irracionais.
- Zoofilia, não é?
- Olha chefe, não propriamente dita. Pode ser só a insinuação. Por exemplo, na prova do líder, ganha aquele que conseguir masturbar um porco e fazê-lo gozar por mais tempo. Na prova do anjo, vence quem agüentar mais bicadas de galinha nas genitais, e por ai vai.
- Você é maluco! Realmente acha que isso dará certo?
- Chefe, procure na internet por vídeos assim. Você verá que o número de acessos é muito maior que os números de vídeos pornôs convencionais. Como eu disse, tudo já foi mostrado. Agora é isso ou pedofilia.
- Credo e cruz, nem me diga esta palavra! Otelo, vamos fazer um teste. Você coloca uma prova dessas daqui dois dias, que é dia de prova do líder. Se o ibope aumentar, você continua com esta sandice até o final. Se continuar igual, você é demitido. Se cair, eu te mato. Entendido?
- Chefe, o senhor não vai se arrepender.
- Espero que nem você.

Otelo só tinha um desafio agora: convencer o patrocinador de que aquilo daria certo.
- Mas Otelo, nós somos os maiores distribuidores de frangos do país. Isso vai queimar nossa imagem.
- Claro que não. Você ainda pode criar o slogan “Nossa galinha é tão boa que dá pra comer mesmo sem fome”, o que acha?
- Preferimos não correr o risco.
- Então façamos assim: daqui dois dias, na prova do líder, vocês não divulgam a marca e eu arco com as despesas. Se o ibope subir, vocês continuam o restante do programa.
- O dobro do ibope ou nada?
- Fechado.

Eis que chega o dia da prova do líder:
- Salve salve meus grandes heróis da nave mãe!
Em uníssono, como grandes marionetes, todos respondem ao apresentador:
- Oi Pascoal, boa noite.
- Tudo pronto para a prova do líder?
- Siiiiim.
- Então bora lá pro lado de fora da casa!
Do lado de fora, camas montadas, luz baixa e pétalas de rosas. Cada cama com o nome de um participante respectivo. Ao lado da cama, gaiolas com diversos animais: galinha, cachorro, gato, cabra e porco.
- Cada um em sua cama e eu vou explicar como funciona a prova.
Cada participante já estava em seu posto, apreensivo com aquela que era uma das provas mais importantes do programa, que garantiria mais uma semana na casa.
- A prova é a seguinte: Cada um de vocês tem aí ao lado uma galinha, um cachorro, um gato, uma cabra e um porco. Você tem que escolher um desses animais para dividir a cama com vocês. Não pode deixar o animal escapar e nem trocar com o colega. Aliás, não pode ter contato algum com os outros confinados, apenas com os animais. Vale qualquer coisa para manter o animal na cama com vocês. Só não pode deixá-lo escapar. Cada vez que tocar o sinal, vocês terão que trocar de animal. Aquele que deixar o animal escapar ou tiver contato com outro participante, é desclassificado.
- Pascoal, posso fazer uma pergunta?
- Claro Dany.
- Vale qualquer coisa mesmo para manter o animal com a gente?
Risos.
- Sim Dany. Se bem que com um mulherão destes, nem o mais burro dos animais escaparia.
Mais risos.
- Então vamos começar? Ah, estava me esquecendo... Logo mais a noite teremos mais surpresas ao longo da prova. Até já!
Corta.
- Agora, vamos dar uma olhadinha?

Dany, a mais serelepe, pegou o gato. Enroscou-o em suas pernas e ficou brincando com ele. Junior, um baiano forte que dava aulas de capoeira, se arriscou com a galinha. Ju e Carol também escolheram os gatos. Nathy tentou o porco, mas não conseguiu dominar o bicho por 15 minutos e foi desclassificada. Carlão pegou o cachorro, afinal tinha um canil e seria fácil dominar o bicho, Cris apostou na cabra, que no primeiro instante já cagou na cama toda e Lucas, não muito esperto, também pegou a sua cabra que já havia cagado na jaula, mas se esqueceu que ela não sabia limpar a bunda e por isso também teve parte de sua cama suja de bosta de cabra.

A prova começou tediosa, os participantes não podiam conversar entre si e estavam brincando mudos com os animais. Apenas Dany, a mais safada de todas, deixava o gatinho arranhar sua calcinha e recriminava-o, como se o gato tivesse ciência do que fazia. Não demorou muito e o ibope do pay per view começou a subir. Foi quando Otelo disse: - É a hora.
No telão instalado no quintal da casa começou a passar vídeos de sexo explícito. Isso estava excitando os participantes. Foi quando a sirene tocou. Danny logo trocou seu gato por um cachorro que, sentindo a excitação de Danny, passou a cheirar sua boceta. Aquilo provocou tamanha excitação na moça, que não hesitou em afastar a calcinha para sentir aquele focinho gelado. Ju optou pelo porco e Carol arriscou com a galinha. Junior trocou a galinha pela cabra. Ele sabia da fama das cabras no interior, mas permaneceu discreto, como se nada tivesse acontecendo. Carlão trocou o cachorro pelo porco, Cris pegou um cachorro e Lucas apostou no gato. Foi quando o apresentador Pascoal entrou ao vivo, causando surpresa nos participantes excitados.

- E aí meus guerreiros, estão mais a vontade?
- Pascoal, essa cabra cagou na minha cama, disse Cris.
- Cris, as cabras fazem isso mesmo. Se quiser uma cama limpa é só sair da prova e entrar na casa.
- Não Pascoal, tá bom aqui.
- E você Dany, gostou mais do cachorrinho.
- Ah Pascoal, você sabe que eu gosto de um cachorro, né?
- Sei sim... Então meus queridos, a partir de agora, vale tudo. Só não vale deixar o animal escapar e nem conversar com o colega. De resto, estão liberados. Fui!

Sai Pascoal, e voltam as cenas de sexo explícito. Agora, intrigando ainda mais os participantes. Dany já tinha se acostumado com o focinho do cocker em sua boceta, e como valia tudo, ela decidiu afastar ainda mais a calcinha, deixando toda a boceta à mostra. O cachorro passou a lamber a boceta de Dany. Na velocidade em que ele cheirava e lambia aquela boceta carnuda, o ibope subia. Nisso, Junior já estava alisando a bunda da cabra. Pobre cabra! Aquele baiano de 1,95 metros tinha fama de ser bem dotado. Com uma mão ele alisava a bunda da cabra, com a outra segurava seu mastro, ainda por baixo da bermuda. Carlão também se acostumou fácil com o porco, porém segurava o pinto do porco fazendo-o gemer. E aquilo parecia que excitava Carlão, muito mais do que ver as meninas rebolando pela casa. O cachorro de Cris já estava excitado vendo aquilo. E ela, vendo aquele membro vermelho, começou a masturbar o cachorro. Lucas, tímido, só deixava o gato lamber seu dedo.

Foi quando o ibope começou a subir como nunca. 62 pontos naquele horário era um marco histórico. Otelo mal se agüentava de tanta felicidade, e teve a brilhante idéia: - Toquem a campainha ininterruptamente.

Os participantes não sabiam o que fazer. Todos queriam a liderança e o 1 milhão de reais. Colocaram todos os animais ao mesmo tempo na cama.
Era a Dany segurando a galinha e o gato, enquanto o cachorro comia o porco. E ela ainda chupava a cabra. Carlão deixou a galinha escapar, mas não foi desclassificado. Otelo queria mesmo ver o circo pegar fogo. A essa altura, Carlão já metia seu pau na cabra, segurando o gato em um braço e uma mão no pau do cachorro, enquanto o porco mandava ver. Ju e Carol tentavam ajudar uma a outra, com a certeza de já estarem desclassificas, mas o que valia era a farra. Foi quando o (in)esperado aconteceu: Cris saiu de sua cama e beijou Lucas, que comia o cachorro. Dany saiu de sua cama e levou junto o gato, que lhe lambia a boceta, enquanto ela enfiava o dedo no cu de Carlão. Junior chamou a eliminada Nathy para a festa e fez ela ficar de pernas abertas e boceta a mostra para que seu cachorro a penetrasse, enquanto ele enfiava a geba no cão. Ju e Carol já estavam em um 69 sincronizado, com os cachorros tentando de alguma forma boliná-las. Uma sodomia instaurada naquilo que era pra ser mais uma prova sem graça de liderança, no reality show.
E o ibope subia, provocando em Otelo muito mais gozo que em todos os participantes do programa juntos.

O celular de Otelo tocou. Era o Senhor Armando.
- Parabéns seu puto. Eu sabia que você era doente, mas nem tanto.
- Qualquer coisa pelo ibope, chefe,

Otelo voltou pra casa feliz. Amanhã era dia de pensar em outra novidade para o reality. Mas, por hora, ele só pensava em uma coisa: Comer sua própria galinha, a Mariana.





Um comentário:

  1. Liliane,
    Belo texto! Gostei muito da estrutura "Conto-Crônica" e da fina ironia dissertativa.
    Valeu!!! Parabéns!!!

    Andreas Nora

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